Sexta-feira, 18 de janeiro de 2013
Última Modificação: 05/11/2018 14:13:49
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Membros da corporação que fazem denúncias ou se manifestam livremente são alvos de punição e perseguição
A crítica e a manifestação pública são garantias constitucionais sob estreito controle na Polícia Militar do Paraná (PM-PR). Passados 27 anos do fim do regime militar no Brasil, a corporação guarda resquícios de uma época superada pela maioria dos brasileiros, em que o silêncio era imperativo.
Eis um exemplo: um subtenente da reserva foi condenado a cinco dias de prisão por ter criticado em um blog as Unidades Paraná Seguro. Outro PM é mencionado em quatro inquéritos policiais, em dois deles como indiciado, por manter um blog que eventualmente critica a segurança pública. Mais: um policial da ativa foi punido com transferência compulsória por ter concedido à imprensa entrevista com teor crítico. São apenas três casos, entre tantos.
No Paraná, a versão militar da “lei da mordaça” é repassada aos policiais por meio de circulares e documentos reservados com um claro aviso: a corporação proíbe manifestações públicas ou críticas ao comando ou ao governo do estado. Quem ousa contrariar é tido como insubordinado na estrutura militar.
Monitoramento
Além de ir contra a Constituição Federal, a censura imposta a policiais militares conflita com o decreto estadual n.º 9192/2010. O documento veda punições a agentes públicos que se manifestem publicamente. A corporação monitora também o que os agentes postam em mídias sociais e comentários feitos em blogs. Um documento reservado da PM obtido pela Gazeta do Povo comunica aos policiais que o corregedor-adjunto da instituição determina que seja averiguado diariamente se há postagens “que venham ferir a imagem da PM-PR”.
No ano passado, uma tenente e outros policiais chegaram a ser presos por se manifestarem. Apesar dos riscos, alguns policiais, antes calados, resolveram falar à revelia da corporação após a Gazeta do Povo publicar relatos de soldados que sofrem abusos na escola de formação dentro dos quartéis.
Um policial da ativa que preferiu não ser identificado contou que, após ter concedido uma entrevista, foi transferido do interior para Curitiba como forma de punição imediata. “Prejudicou minha família, meu trabalho. Tive um gasto muito grande”, relata. Ele lembra que a sindicância que apura o caso nem terminou, mas ele já foi punido. O policial também optou por não revelar sua patente.
Para a Associação de Defesa dos Direitos dos PMs (Amai), o “terror” instaurado por meio dos inquéritos policiais e processos tem conseguido calar parte dos policiais. A maioria prefere o silêncio. Os que querem se manifestar recorrem ao anonimato, seja para postar na internet, seja para entrevistas. “O medo existe porque a perseguição é grande e implacável. A Amai repudia esse cerceamento”, afirma o advogado da associação, Marinson Luiz de Albuquerque.
Militarismo na corporação é ultrapassado, dizem especialistas
Tropa, farda, disciplina e hierarquia são características de um exército, mas são também palavras muito conhecidas dentro das polícias militares no Brasil. Além de estarem à frente do combate ao crime, os policiais são a força reserva e auxiliar do Exército por origem e natureza. Por isso, na avaliação dos especialistas, o veto à livre expressão, as perseguições e os abusos são resultado do militarismo dentro das polícias, algo anacrônico.
Presidente do Grupo de Estudos da Violência da Universidade Federal do Paraná (UFPR), o sociólogo Pedro Bodê diz que há mais punições por pequenas infrações (como entrevistas e manifestações) do que por problemas graves. “É uma queixa antiga dos policiais. Eles são submetidos ao código militar, sem participação política na sociedade”, explica. Segundo ele, os abusos contra policiais se refletem nas ruas.
O historiador da UFPR Dennison de Oliveira defende uma mudança nas instituições policiais militares. “Desde que me lembro, a polícia é assim. Sempre foi comandada por militares. Em 1988, com a nova Constituição, a subordinação da PM passou a ser ao governador”, comenta. Na avaliação dele, a polícia deveria ser menos repressiva e mais científica. “Militarismo na polícia é algo fora de seu tempo, arcaísmo.”
Ex-secretário da Segurança defende PM
O ex-secretário Nacional da Segurança Pública, coronel da reserva paulista José Vicente da Silva, defende a Polícia Militar e lembra que todos que ingressam na instituição conhecem suas leis. “A disciplina é um instrumento rígido em todas as polícias do mundo. É intolerável que se faça crítica fora das normas da instituição”, diz.
Segundo ele, “essas são as regras”, e criticar uma ordem superior publicamente “é passível de punição”. No entanto, Silva ressalta que perseguições devem ser punidas também. “Não se podem tolerar tratamentos de humilhação, perseguição ou qualquer abuso a subordinados.”
O coronel diz que vítimas de perseguições dentro dos quartéis devem buscar a Justiça comum caso achem necessário. “Abusos são péssimos exemplos. Esses policiais que são vítimas podem maltratar o cidadão achando que é algo natural”, completa.
Fonte: gazeta