Segunda-feira, 20 de maio de 2013
Última Modificação: 05/11/2018 14:07:54
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Dos 21 milhões de hectares que precisam ser recuperados conforme o Código Florestal, apenas 1% deve ocupar terrenos agriculturáveis
Um ano após entrar em vigor, o Código Florestal ainda não provocou alterações no uso do solo brasileiro. Além dos questionamentos judiciais que perduram, está atrasada a implantação das ferramentas que vão determinar as áreas a serem preservadas e recuperadas em cada estado e bioma. Por outro lado, já é possível estimar quais serão os impactos da lei. Um estudo desenvolvido com o apoio da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República indica que a interferência do reflorestamento sobre a produção de alimentos será mínima: dos 21 milhões de hectares (Mha) que precisam ser recuperados, 99% podem ser negociados por meio de títulos ou ocupar áreas inaptas para a agricultura. Apenas 1% (250 mil hectares) ocupariam terrenos agriculturáveis.
O autor do estudo, o pesquisador Britaldo Silveira Soares-Filho, do Centro de Sensoriamento Remoto da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), sustenta que a fronteira agrícola brasileira pode se expandir nas áreas de pastagens, atividade hoje feita em uma vasta extensão territorial e com baixa produtividade. Atualmente, a pecuária ocupa aproximadamente 23% do território brasileiro e a agricultura, apenas 7%.
A vegetação nativa se estende por uma área muito maior (veja infográfico), mas Britaldo-Soares ressalta que a maior parte dela está em áreas privadas e não é protegida, além de estar concentrada na Amazônia. A Mata Atlântica, bioma reduzido a apenas 3% de sua área original, precisa ser recomposta em 6 milhões de hectares, dos quais aproximadamente 1,5 Mha são no Paraná.
Segundo Soares-Filho, se por um lado as mudanças no Código Florestal feitas no Congresso Nacional reduziram em 60% a área a ser reflorestada, por outro lado foram aprimorados os mecanismos que permitirão essa recomposição. O principal é a Cota de Reserva Ambiental (CRA), um título que indica o excedente de área de vegetação nativa e que pode ser negociado com outra propriedade no mesmo bioma que está com déficit de vegetação.
Considerando as possibilidades de negociação via CRA apenas 250 mil hectares de áreas aptas à agricultura seriam usados para recomposição florestal. Segundo o pesquisador, essa “invasão” ocorreria quase que exclusivamente no bioma amazônico, no estado do Mato Grosso. No Paraná, o estudo indica que 400 mil hectares poderiam ser negociados via CRA, e o restante da recomposição poderia ocupar as áreas de pasto, sem necessidade de usar terrenos agriculturáveis.
Panorama completo virá após cadastro
Independentemente das estimativas que começam a surgir sobre os impactos do Código Florestal, especialistas dizem que é crucial a implantação do Cadastro Ambiental Rural (CAR). Em evento na Assembleia Legislativa na semana passada, diferentes entidades indicaram que o cadastramento, que ainda nem começou, levará mais de um ano para ser feito – considerando uma força de trabalho de 1,5 mil pessoas, o que ainda não existe.
Depois de feito o CAR, as propriedades poderão negociar a Cota de Reserva Ambiental (CRA), respeitando o Plano de Recuperação Ambiental (PRA), de responsabilidade de cada estado. Nesse ponto haverá necessidade de mais mão de obra, aponta Mário Mantovani, diretor de políticas públicas da organização S.O.S Mata Atlântica. “Para fazer o PRA, será preciso assistência técnica. Esse será um grande gargalo.”
De acordo com Laura Barcellos Antoniazzi, pesquisadora do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), serão necessárias várias ações governamentais para esses mecanismos decolarem. “A recuperação vai depender bastante dos PRAs, então podem ser mais ou menos rápidas dependendo de como cada estado der andamento a isso.”
A Federação da Agricultura do Paraná (Faep) não quis comentar as estimativas de recomposição, e afirmou que aguarda o cadastro rural e a conclusão do inventário florestal que está sendo feito no Paraná. A entidade espera ainda a regulamentação do Bioclima, projeto do governo do Paraná que pretende remunerar os proprietários rurais que preservem áreas naturais acima do exigido por lei.
Todos os pesquisadores apontam a necessidade de se criar mecanismos de recomposição. “Precisamos avançar em ações de incentivo e pagamento, e não ficar apenas multando ou processando”, diz Mantovani.
Fonte: gazeta