Terça-feira, 11 de março de 2014
Última Modificação: 05/11/2018 13:55:44
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Destempero do “clima neutro” afetou os dois principais produtores e ainda ameaça o Centro-Norte
As perdas climáticas nas lavouras de soja, confirmadas no último mês, somam 2,1 milhões de toneladas nos dois estados que são líderes em produção no Brasil. O Paraná tem sido o mais prejudicado, com recuo de 10,9% ou 1,85 milhão de toneladas. Mato Grosso já perdeu 250 mil toneladas, ou 1% do volume esperado, sem contar o fato de que as chuvas em excesso afetam a qualidade dos grãos. O recuo foi apurado pela Expedição Safra Gazeta do Povo, que acaba de lançar uma avaliação dos estragos e segue monitorando as lavouras em 14 estados.
As previsões de que a temporada de neutralidade climática teria altos e baixos, com distribuição irregular de precipitações, se confirmaram entre janeiro e fevereiro. No ano passado, o quadro meteorológico era semelhante, mas faltou menos chuva na fase de enchimento de grãos no Paraná e as temperaturas não chegaram marcas tão elevadas. Os termômetros registraram perto de 70 graus em lavouras das regiões Norte e Norte Pioneiro paranaenses. As enxurradas ainda preocupam os produtores mato-grossenses. Um quarto das lavouras ainda não foi colhido.
Na capital nacional da soja, em Sorriso (MT), tudo parecia ir bem até um mês atrás. Mas agora “tem soja sendo colhida com índices de 20% a 25% de umidade”, afirma o produtor e líder sindical Laércio Lenz. O produtor Evandro Lermen conta que, quando as chuvas chegaram, 70% de uma área de 5 mil hectares estavam prontos para a colheita. E um terço apresentaram grãos ardidos além do padrão. Parte da colheita, nessas condições, acaba virando ração. “O grão úmido gera despesa extra de secagem, e para o ardido não existe recuperação.” A produtividade caiu do potencial de 62 para 50 sacas por hectare, conta.
Com a quebra de 2,1 milhões de toneladas em dois estados, a previsão de uma safra nacional de 91,05 milhões está sendo rebaixada. Ainda assim, a tendência é de recorde. O maior volume produzido pelo país foi de 81,9 milhões de toneladas, na temporada passada. O Brasil ainda sustenta as previsões de que as exportações vão passar de 45 milhões de toneladas (ante 42,8 milhões em 2012/13).
As previsões climáticas indicam chuvas irregulares para o Centro-Norte, que produz 10% da soja brasileira. A região abrange os estados de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, a nova fronteira do MaToPiBa, onde três quartos das lavouras ainda não foram retirados do campo. Esses quatro estados serão percorridos pela Expedição Safra ainda neste mês.
Recorde virou exceção, mas sustenta resultado no milho
Clima bem temperado virou exceção nesta temporada no Paraná. Poucas regiões conseguiram avançar em produtividade, deixando para trás previsões recordes. Uma exceção é a zona de abrangência da cooperativa Agrária, que planta 33 mil hectares de milho e 75 mil hectares de soja no distrito de Entre Rios, em Guarapuava (Centro do estado).
Na oleaginosa, houve perda de 5% em relação à produtividade esperada. O resultado traçado pelo avanço da colheita fica perto de 4,7 mil quilos por hectare, um recuo ao índice de 2011/12. Já no cereal, os cooperados estão registrando até 16 mil kg/ha. Marcas individuais nesse patamar prometem média de 12 mil kg/ha, perto de 500 kg acima dos melhores verões. “Estamos com quebra na soja, mas com um resultado surpreendente no milho”, frisa o agrônomo Leandro Bren, coordenador de assistência técnica.
Safra estadual
O cereal também promete boa safra nos Campos Gerais, importante polo produtor do estado. O plantio de milho nas regiões que foram mais afetadas por veranico é tradicionalmente menor no Paraná. Esse quadro embasa a avaliação preliminar da Expedição Safra Gazeta do Povo de que a produtividade média do milho no estado deve ficar 1,2% acima da registrada no verão passado, em 8,15 mil kg/ha.
Safrinha deve repor um terço das perdas
A quebra na produção de soja e a desvalorização do milho no mercado internacional impulsionam a área de segunda safra da oleaginosa no Brasil nesta temporada. A soja safrinha, que será colhida até junho, tem potencial para “devolver” volume equivalente a um terço do que foi perdido no primeiro ciclo da cultura em Mato Grosso e no Paraná.
A Expedição Safra Gazeta do Povo apurou que safrinha deve somar ao menos 700 mil toneladas, com forte ampliação da área nos dois maiores produtores nacionais. No estado do Centro-Oeste, as primeiras estimativas apontavam 500 mil hectares plantados. Novas avaliações indicam área inferior a 300 mil hectares. No Paraná, estima-se mais de 100 mil hectares.
Essa redução está associada aos riscos do plantio em sequência contínua. No cultivo de soja sobre soja, a pressão de pragas e doenças é ainda maior e eleva custos de aplicações extras de agrotóxicos. “Plantar soja safrinha é um retrocesso tecnológico. O produtor perde produtividade e os custos aumentam, tanto no ano atual como nos anos seguintes”, avalia o assessor técnico-econômico da Ocepar, Robson Mafioletti.
Essa avaliação, de que a safrinha é um tiro no pé, também prevalece em Mato Grosso. Há produtores que tentam amenizar riscos adubando o solo e obtendo plantas mais saudáveis. Os rendimentos previstos são 20% inferiores à média nacional do verão.
“É impossível cultivar segunda safra de soja sem tecnologia, até porque as plantas que germinaram já estavam tomadas pela ferrugem asiática”, comenta o analista do Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea) Angelo Ozelame. Só em Sorriso, a oleaginosa ocupa cerca de 70 mil hectares, mesmo com recuo de 30% no planejamento inicial pela valorização do milho registrada nos últimos meses.
Fonte: gazeta