Segunda-feira, 17 de março de 2014
Última Modificação: 05/11/2018 13:55:07
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Para que o país recupere a autossuficiência em petróleo, a estatal terá de executar seus planos à risca – o que não faz há tempo
A autossuficiência em petróleo foi adiada. No ano passado a Petrobras chegou a anunciar que o Brasil retomaria esse status ainda em 2014, mas, semanas atrás, empurrou o prazo para o ano que vem. Mesmo com o tempo extra, a missão continua complicada. A começar pela enorme dificuldade da companhia em cumprir suas próprias metas.
A produção de petróleo da Petrobras tem frustrado expectativas pelo menos desde 2007. A diferença entre as projeções de longo prazo feitas em cada plano de negócios e o resultado concreto, anos mais tarde, variou de 13% a 28%, conforme levantamento feito pela Gazeta do Povo.
Cumprir metas ficou mais difícil a partir de 2012, quando, além de não crescer o esperado, a produção de petróleo passou a cair, afetada por paradas em plataformas e pelo declínio produtivo de campos importantes. No ano passado, a estatal produziu 1,931 milhão de barris por dia, 750 mil barris a menos que o projetado quatro anos antes.
Marco
A “autossuficiência volumétrica”, que a Petrobras espera para o ano que vem, é a condição em que a produção nacional de petróleo supera o consumo de derivados. O Brasil chegou a atingir esse nível na década passada, mas depois regrediu, com a explosão do consumo de combustíveis e a estagnação da atividade petroleira.
Recuperar a autossuficiência não depende só da Petrobras, mas também das outras companhias que atuam no país, principalmente Statoil, Shell, Sinochem e BG. O desempenho da estatal, no entanto, será determinante, pois ela é responsável por mais de 90% da produção. A conquista também está condicionada a um crescimento bem mais fraco do consumo de derivados, de 2,7% ao ano entre 2014 e 2020, segundo a Petrobras. No ano passado, a demanda cresceu 5,3%, quase o dobro disso.
“Tecnicamente é possível chegar à autossuficiência. Mas não será fácil”, avalia Adilson de Oliveira, professor do Instituto de Economia da UFRJ. “Dependerá de duas variáveis centrais. Uma é a empresa ter recursos, o que depende do reajuste dos preços. A outra é a capacidade da empresa de administrar seus quadros”, diz Oliveira.
Realismo
Quando assumiu a presidência da Petrobras, em 2012, a engenheira química Graça Foster promoveu uma revisão geral – para baixo – das metas da companhia. “Os planos ficaram mais modestos e honestos. A produção diária esperada para 2020 caiu de 5 milhões para pouco mais de 4 milhões de barris”, diz André Furtado, professor do Departamento de Política Científica e Tecnológica da Unicamp.
O resultado das projeções de longo prazo de Graça Foster só será conhecido a partir de 2016, horizonte do primeiro plano de negócios de sua gestão, publicado em 2012. O que se sabe é que as previsões de curto prazo ficaram próximas da realidade. A atual direção da empresa esperava uma média diária de 2 milhões de barris em 2012 e 2013, pouco acima da produção obtida.
A expectativa para 2014 é de um crescimento de 7,5%, o que levaria a produção para até 2,095 milhões de barris. Mas o ano não começou promissor: a produção de janeiro foi de 1,917 milhão de barris diários, abaixo da média de 2013.
Exceção, pré-sal supera expectativas
Em meio à série de previsões frustradas nos últimos anos, a Petrobras pode se orgulhar de estar superando, com folga, ao menos uma de suas metas: a do pré-sal. No plano de negócios 2010-2014, a companhia previu que a produção de petróleo nesses campos alcançaria neste ano 241 mil barris diários, em média. No último dia 27 de fevereiro, a companhia anunciou que alcançou a marca de 412 mil barris de petróleo em um dia.
Para Edmilson Moutinho dos Santos, professor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP, os recordes no pré-sal estão relacionados à frustração da produção em outros campos. “Como o pré-sal é muito grande e produtivo, faz todo o sentido que a empresa aplique o máximo de recursos nele. Vale mais a pena apostar no que dá muito volume do que investir em campos declinantes”, diz. “Mas, enquanto o pré-sal não produz o suficiente para ‘pagar todas as contas’, a produção total diminui.”
Para Adriana Fiorotti Campos, professora da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), os resultados do pré-sal são consequência de programas de produção em águas profundas iniciados na década de 1970. “O progresso tecnológico evoluiu em ritmo muito veloz, e o sucesso exploratório dessa região é muito alto”, diz a economista.
Fonte: gazeta