A prefeitura de São Paulo propôs ao Ministério da Justiça uma ação articulada com o estado do Acre para limitar a entrada diária de até 40 haitianos na capital paulista. De acordo com o secretário de Direitos Humanos e Cidadania, Rogério Sotilli, a medida é necessária para que se consiga dar um atendimento adequado aos imigrantes, como abrigos estruturados e encaminhamento para empregos. “Há uma quantidade grande de haitianos que estão vindo para São Paulo e, se a gente não coordenar, não vamos conseguir dar uma atenção adequada”, apontou. Ele informou que a questão está sendo debatida hoje (6), em mais uma reunião entre o governo federal e os governos municipal e estadual de São Paulo sobre o tema.
O deslocamento desses imigrantes para o Sul e o Sudeste do país está ocorrendo desde o fechamento, no início de abril, do abrigo para haitianos em Brasiléia, no Acre. A maior parte dos que chegaram a São Paulo foi acolhida na Igreja Nossa Senhora da Paz, no Glicério, região central da cidade.
Muitos vieram de ônibus com passagens pagas pelo governo do Acre. O estado enfrenta uma grande cheia dos rios que cortam a região, que o deixou isolado do restante do país. Pela paróquia paulistana, que mantém um centro de acolhida, passaram mais de 500 imigrantes no último mês. De acordo com o padre Antenor Dalla Vecchia, diretor da Casa do Migrante, pelos menos 400 já foram encaminhados para vagas de emprego.
Durante a reunião em Brasília, o município pediu ainda que os haitianos sejam encaminhados à cidade já com a documentação de permanência regularizada. “[Quando isso não é feito,] atrapalha muito o nosso trabalho de recebimento dessas pessoas, então é fundamental que o governo federal ajude a articular para que toda a documentação seja feita no Acre”, explicou o secretário de Direitos Humanos de São Paulo. Para conseguir um encaminhamento de emprego, é preciso que os haitianos tenham carteira de trabalho, CPF e protocolo do visto humanitário. Sotilli informou que também está sendo discutida a criação de um equipamento permanente, em São Paulo, para a acolhida de imigrantes.
O tema também foi debatido entre o prefeito Fernando Haddad e o embaixador do Haiti, Madsen Cherubin, em uma reunião na manhã de hoje. Segundo Sotilli, a prefeitura propôs ao governo haitiano que seja feita uma campanha de esclarecimento para que os que quiserem vir ao Brasil o fazerem por via aérea, para que não dependam da ação de atravessadores, como os chamados coiotes. “Eles vêm por terra, porque são induzidos de que no Brasil é mais fácil entrar assim. Existe falta de esclarecimento sobre isso”, destacou. Além disso, a embaixada comprometeu-se a criar um posto avançado na capital paulista, que não conta com um consulado, para atender melhor os haitianos.
Hoje à noite, segundo a prefeitura de São Paulo, deve começar a funcionar o abrigo, cuja criação foi anunciada ontem. O lugar era uma reivindicação dos padres que dirigem o centro de acolhida da igreja, pois não havia espaço suficiente para acolher os imigrantes. Ontem, 52 haitianos dormiram no salão de festas da paróquia, que não conta com infraestrutura adequada, e outros 30 ficaram na casa do migrante. A Agência Brasil esteve no local no fim da manhã de hoje e conferiu que o espaço, que funciona a 200 metros da igreja, ainda está passando por reparos. A Secretaria Municipal de Assistência Social, no entanto, garantiu que eles já poderão dormir lá esta noite.
O padre Dalla Vecchia disse que tem dúvidas se o local estará pronto no prazo prometido. Além do espaço físico, ele relata a necessidade de uma equipe de funcionários para atuar na unidade. “Não temos conhecimento do pessoal que vai trabalhar lá. Pode ser que estejam pensando nisso, mas é preciso, por exemplo, alguém para controlar a entrada, segurança para as pessoas que se estabeleçam ali”, apontou. A assessoria de imprensa da Secretaria de Assistência Social, por sua vez, informou que a gestão do espaço será feita pela igreja e que a secretaria apoiará no que for necessário, mas não garantiu que um corpo técnico atuará no abrigo.
Dalla Vecchia destaca que é preciso pensar um espaço permanente de acolhida para imigrantes. “Estamos reivindicando um espaço que seja administrado pelo poder público. Não podemos nos responsabilizar por todos os imigrantes que chegam”, afirmou. O padre explica que é necessário prestar um atendimento diferenciado para essa população, uma vez que ela demanda serviços específicos, como ações para adaptação à nova cultura, cursos de língua, orientação quanto aos documentos, entre outras questões.
O pároco avalia que, embora as medidas provisórias anunciadas pelos governos municipal e estadual sejam insuficientes, elas apontam um avanço. “A chegada dos haitianos provocou a necessidade de se repensar a política migração e se repensar a forma de atender a pessoas diferentes, essa diversidade”, declarou. Ele reforça a necessidade de fazer a sociedade refletir e ver os imigrantes não como um “empecilho, mas como uma riqueza, que tem um valor mais importante que a moeda”. Ele lembra que a sociedade brasileira é formada por essa miscigenação de culturas. “São diversas expressões que vem nos ajudar a crescer como povo”.