Sexta-feira, 30 de maio de 2014
Última Modificação: 05/11/2018 13:50:30
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Número foi divulgado ontem em estudo da Fiocruz e do Ministério da Saúde e está muito além da proporção de 15% recomendada pela OMS
A pesquisa Nascer no Brasil, divulgada ontem pelo Ministério da Saúde e pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), apresentou um resultado alarmante: 52% dos nascimentos no país são por cesariana; no setor privado essa proporção chega a 88%. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que esse valor seja de 15%, mas a última vez que o país teve um índice dentro do aconselhado foi na década de 1970.
A pesquisa entrevistou 23.894 mulheres em 266 maternidades públicas, privadas e mistas, incluindo hospitais de médio e grande porte, localizados em 191 municípios de todos os estados do Brasil. Segundo a coordenadora da pesquisa, Maria do Carmo Leal, as cesarianas expõem as mulheres e os bebês a riscos desnecessários na hora do parto. “O índice elevado de cesarianas se deve a uma cultura arraigada no Brasil de que o procedimento é a melhor maneira de se ter um filho”, explica.
A pesquisa não encontrou justificativas clínicas para um porcentual tão elevado dessas cirurgias. Estima-se que quase um milhão de brasileiras são submetidas à cesariana sem obstetrícia adequada, sendo expostas a maiores riscos de mortalidade e gastos. O resultado contrasta com o desejo das brasileiras de ter um parto normal no início da gestação – são 70%. Dos 30% restante, um terço apresentou o medo da dor como razão para escolher a cesariana.
Essa justificativa, de acordo com a coordenadora técnica do programa Mãe Paranaense, Olga Peterline, foi aceita por muito tempo por se tratar de uma relação natural do ser humano com a dor. “Todos nós temos medo, mas a dor é suportável. A cesárea é um recurso para salvar vidas, tanto da mãe quanto do bebê”, afirma. É o caso de Kelly Oliveira, 30 anos, grávida de 27 semanas das gêmeas Melissa e Nicole. A gravidez é de alto risco e existe a chance de as meninas nascerem prematuramente.
Ela comenta que pesquisou muito sobre o assunto e reconheceu os benefícios do parto normal, mas um problema no colo do útero retirou qualquer chance de escolha. “No meu caso a cesariana é inevitável. Como é a primeira gestação não tem como diagnosticar com precisão o problema”, conta. Kelly chegou a ser internada e há um mês faz repouso absoluto.
Mudança de ideia
O estudo mostra que a grande mudança da preferência inicial de parto ao longo da gravidez não pode ser explicada pelo surgimento de complicações, mas que a orientação no pré-natal pode estar induzindo a isso. “Há certamente uma influência do pré-natal na decisão das mulheres pelo tipo de parto, mas as amigas e os familiares também influenciam”, diz Leal.
“Queria fazer parto normal, mas fiquei com medo e aos sete meses optei pela cesárea. Perguntei ao médico e às amigas, mas a decisão final foi minha”, diz Caroline Fagundes, 22 anos, mãe da pequena Larissa de três meses. Ela conta que começou o pré-natal na rede pública, mas mudou para o setor privado e que a facilidade de ter um horário marcado influenciou na escolha.
Segundo a pesquisa, o histórico de adoção de medicamentos e procedimentos considerados desnecessários ou inadequados pela OMS nos hospitais do país na hora do parto pode ajudar a explicar as decisões das mães brasileiras pela cesariana. O texto do estudo narra que no momento do parto “a maioria das mulheres ficou restrita ao leito e sem estímulo para caminhar, sem se alimentar durante o trabalho de parto, usou medicamento para acelerar as contrações e deu à luz deitada de costas, muitas vezes com alguém apertando sua barriga”.
Fonte: gazeta