Quinta-feira, 16 de outubro de 2014
Última Modificação: 05/11/2018 13:39:06
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Com aumento da renda, jovens se dedicam ao estudo. Em 2013, 70,4% das brasileiros com 18 a 24 anos trabalhavam ou buscavam emprego
A participação dos jovens no mercado de trabalho é a menor desde o início deste século. Segundo a mais recente Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), divulgada pelo IBGE em setembro, pouco menos de 16 milhões de brasileiros com 18 a 24 anos estavam trabalhando ou procurando emprego em 2013, o equivalente a 70,4% da população dessa faixa etária. É a menor proporção desde 2001, quando a Pnad passou a divulgar esse dado.
INFOGRÁFICO: Veja a participação dos jovens no mercado de trabalho
O encolhimento da mão de obra jovem, que ocorre desde a segunda metade da década passada e ajuda a manter as taxas de desemprego relativamente baixas, deve influenciar o mercado de trabalho e o próprio desenvolvimento do país. Ainda não se sabe se os efeitos serão mais positivos ou negativos; isso dependerá das causas que estão por trás do movimento, ainda um tanto controversas.
É fato que, com o Brasil em plena transição demográfica, a população mais nova está diminuindo. Mas a saída desse público do mercado de trabalho é bem mais acelerada. Em 2008, 75% dos jovens estavam ocupados ou em busca de trabalho; desde então, o índice caiu quase cinco pontos porcentuais.
No ano passado, a população dessa faixa etária diminuiu em 82 mil pessoas, segundo a Pnad. Ao mesmo tempo, 335 mil deixaram a população economicamente ativa. A diferença, de 253 mil, representa o número de jovens que efetivamente largaram o emprego ou pararam de procurar um.
Explicação
Duas hipóteses são levantadas para explicar o fenômeno, uma boa e uma ruim. A primeira é que, com o aumento da renda dos pais, os filhos puderam sair do emprego e se dedicar só aos estudos. A segunda é que a turma que abandonou o mercado de trabalho – ou nem chegou a entrar nele – estaria engrossando o grupo dos que não trabalham nem estudam, também conhecidos por “nem-nem”. Eles eram 23,4% da população com 18 a 24 anos em 2012, segundo o último informe do IBGE sobre o assunto.
O mais provável é que esteja ocorrendo um pouco de cada, com alguma preponderância da primeira hipótese. “O número de jovens ‘nem-nem’ ficou mais ou menos constante nos últimos 12 anos. E diminuiu o grupo dos que simultaneamente estudam e trabalham, com muita gente passando a apenas estudar”, diz Naercio Aquino Menezes Filho, coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper.
Mas, para ele, o fato de haver mais jovens concentrados nos estudos não significa que nos próximos anos o mercado de trabalho receberá uma enxurrada de profissionais altamente qualificados, capazes de elevar substancialmente a produtividade da economia brasileira, praticamente estagnada há alguns anos.
“A qualidade do ensino no Brasil é muito baixa, e também não acredito que os jovens usem o tempo em que trabalhavam para estudar mais. Provavelmente vão dedicá-lo ao lazer”, avalia Menezes Filho. “E não estamos falando de jovens ingressando ou permanecendo na faculdade. A grande maioria está atrasada, no ensino fundamental ou médio.”
O economista Raul Luís Assumpção Bastos, da Fundação de Economia e Estatística (FEE) do Rio Grande do Sul, até espera uma melhora da produtividade com o maior nível de educação formal dos futuros trabalhadores, mas pondera que só isso não basta. “A produtividade não depende só disso. Também depende, e muito, de mais investimentos privados, em máquinas e equipamentos, e públicos, em infraestrutura. E o Brasil não tem conseguido investir mais.”
Quem mora com os pais quer salário mais alto
Os jovens demoram cada vez mais para deixar a casa dos pais. Esse fenômeno – observado no Brasil e em boa parte do mundo – pode estar ampliando a permanência dessas pessoas nos bancos da escola e, por outro lado, reduzindo sua participação no mercado de trabalho.
“Como os pais estão mais tolerantes e aceitando o filho em casa por mais tempo, sem pressioná-lo a complementar a renda familiar, o jovem não precisa aceitar qualquer salário para entrar no mercado de trabalho. O menor salário aceito tem crescido conforme as gerações, e conforme a família enriquece”, diz Daniel Domingues dos Santos, professor de Economia da USP em Ribeirão Preto.
O economista Raul Luís Assumpção Bastos, que coordena a Pesquisa de Emprego e Desemprego da FEE na Região Metropolitana de Porto Alegre (RMPA), observa que a decisão do jovem depende muito do que ocorre com o chamado “chefe de domicílio” – e, no geral, a situação deste melhorou desde o início da década passada, com o aumento da renda e a queda no desemprego.
“No ano passado, a taxa média de desemprego na RMPA foi de 6,4%. A dos chefes de domicílio, de apenas 3,5%”, diz Bastos. “Em conjunto com o aumento da renda, isso dá mais condição aos jovens de se dedicarem só aos estudos. Tanto é assim que, em 1993, tínhamos 14,6% dos jovens de 16 a 24 anos da RMPA somente estudando. Essa proporção chegou a 18,5% em 2003, e em 2013 alcançou 23,9%.”
Fonte: gazeta