Terça-feira, 24 de fevereiro de 2015
Última Modificação: 05/11/2018 13:29:51
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A última seca severa no Paraná –comparável com a crise hídrica que assola São Paulo – foi em 1944. Desde então, aconteceram episódios de estiagem, mas nada que pudesse ser considerado anormal. E ao contrário do estado vizinho, que pena com um período prolongado de chuvas abaixo do necessário, por aqui a água que cai é mais do que suficiente. Mas a análise dos dados de temperatura reforça os motivos para economizar água já. Os dias mais quentes que a média histórica, registrados nos últimos tempos, mostram que tanto a evaporação quanto o consumo de água estão aumentando rapidamente e são sinais de alerta.
A pedido da Gazeta do Povo, o diretor do Instituto Tecnológico Simepar, Eduardo Alvim Leite, reuniu informações meteorológicas relacionadas à oferta de água no rio Iguaçu (o principal do estado), ao regime de chuvas e à variação de temperaturas. Se depender da quantidade de chuva registrada nos últimos anos, o Paraná está numa situação de tranquilidade em relação aos estados vizinhos. É que os mapas meteorológicos têm mostrado o território paranaense como uma faixa de normalidade, já que em São Paulo choveu pouco e em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul choveu demais. E tais cenários não podem ser atribuídos tão somente a fenômenos periódicos, como El Niño e La Niña: talvez já sejam consequência de mudanças climáticas.
Alvim Leite explica que há três níveis de déficit hídrico, dependendo de uma combinação de fatores, como sequência de dias sem chuva ou chuvas em quantidade insuficiente, associados ou não a temperaturas elevadas. A chamada seca meteorológica ocorre mais frequentemente e o tempo é contado em dias. Já a seca meteorológica, que leva semanas, começa a afetar o solo, que perde umidade e começa a afetar plantações. A última registrada no Paraná foi em outubro do ano passado, nas regiões Oeste e Central.
A seca hidrológica, que leva meses, afeta consideravelmente a vazão dos rios, mas, principalmente, a água depositada no subsolo. É o que está acontecendo em São Paulo. O diretor do Simepar comenta que, fora o último registro severo há 71 anos afetando o rio Iguaçu, o Paraná teve um episódio moderado de seca hidrológica em 2006. Ele destaca que o monitoramento é constante para tentar identificar qualquer sinal de alerta.
O foco emergencial das políticas públicas de segurança hídrica no Paraná é a perfuração de 150 poços artesianos em localidades com dificuldades de acesso a água. Maquinário próprio, adquirido pelo Instituto Águas Paraná no ano passado, deve realizar as obras. A operação deve consumir R$ 60 mil ao mês – mas os trabalhos só devem começar depois que o governo estadual voltar a ter dinheiro para investir. De acordo com Eneas Souza Machado, diretor de Gestão de Bacias Hidrográficas do Instituto, o trabalho será concentrado em comunidades rurais. Paralelamente, o órgão prepara, em parceria com a Agência Nacional de Águas (ANA), um diagnóstico dos potenciais casos de estresse hídrico no estado.
Como a Gazeta do Povo mostrou em outubro do ano passado, os reservatórios que abastecem Curitiba e região metropolitana estão em situação tão tranquila que poderiam garantir o consumo de água por oito meses mesmo que não caísse uma só gota de chuva. Como é pouco provável que isso aconteça, as represas são capazes de suportar a demanda por mais de um ano. Mesmo com a oferta de água de sobra em todas as regiões do estado, nem todas as cidades estão livres de penar com interrupções no fornecimento. Algumas estruturas não estão dimensionadas para aguentar o consumo, principalmente nos dias quentes. Em dezenas de municípios paranaenses, ou há falta de rede de tratamento ou de distribuição de água.
A situação em São Paulo é tão paradoxal – o Brasil, país com maior volume de água potável do mundo não garantir o consumo para a cidade mais populosa – que o principal jornal do mundo, o The New York Times , publicou reportagem sobre o assunto na semana passada.
Os dados de consumo de água no Paraná mostram que a crise hídrica paulista não afetou os hábitos dos paranaenses – talvez porque a seca pareça distante. Em si, a ideia de que não se deve desperdiçar um recurso tão precioso como a água potável já seria mais do que razoável, mas algumas pessoas precisam de um “estímulo” mais concreto e próximo para colocar a mão na consciência e na torneira. Então, lá vai: a água vai custar bem mais num futuro próximo. Está autorizado o reajuste da tarifa da Sanepar em 12,5% – sendo 6,5% em março e 6% em junho.
O peso no bolso não deve parar por aí. A energia elétrica representa mais de 10% do custo da água. Sem energia, não é possível operar as estações de tratamento ou bombear a água até as unidades consumidoras. A questão é que a energia elétrica tem aumentado bem acima da inflação – no ano passado foram 24% de reajuste, a Copel “represou” cerca de 10% para aplicar em 2015 e, para piorar, neste ano o valor da geração de energia disparou, em boa parte por causa da crise hídrica que diminuiu a produção das hidrelétricas e forçou o uso de termelétricas.
A estimativa é de que o custo da energia vai disparar neste ano – com a nova bandeira tarifária que deve entrar em vigor já no mês que vem. A Sanepar paga pela energia elétrica o mesmo valor cobrado das indústrias e os especialistas apontam que o preço vai subir cerca de 40% em 2015. A Sanepar pagou R$ 15 milhões em energia elétrica em janeiro de 2013 e de 2014. Já no mês passado, a despesa subiu para R$ 21 milhões – 40% a mais.
Consultor especializado em comercializações de energia para a indústria, Marcelo Parodi, da Compass, prevê alta de até 53% na energia elétrica e que o valor pago a mais será, sim, repassado para a tarifa de água. Nessa situação, o ideal seria que a população já buscasse formas de se adaptar, gastando menos água. Sobraram motivos para racionalizar.
Se, por um lado, a quantidade de chuvas está dentro da faixa de normalidade no Paraná, por outro, chama a atenção o pico nos termômetros. O verão 2014-15 deve ser o mais quente desde que o Simepar começou a monitorar as temperaturas, há duas décadas. E as previsões para o próximo trimestre também indicam recordes históricos. O clima mais quente, além de aumentar o ritmo da evaporação da água, também motiva o consumo maior de água. Diante do cenário, Alvim Leite considera que é o caso dos paranaenses se anteciparem e já começarem usar a água com mais racionalidade, de forma a estarem preparados para dificuldades futuras.
Fonte: Gazeta